Autêntico, resiliente e movido por uma paixão que atravessa fronteiras, DJ Bravat é um dos nomes mais marcantes da cena eletrônica LGBTQIA+ brasileira com presença global. Desde 2009, ele leva sua arte para pistas ao redor do mundo, criando conexões profundas por onde passa, da festa Backdoor em Amsterdam a eventos em países onde a diversidade ainda é resistência.
Com mais de 70 apresentações internacionais no currículo, Bravat construiu sua trajetória enfrentando desafios, adaptando-se a públicos distintos e mantendo sempre sua identidade musical como ponto de partida. Seus sets vão além do entretenimento. São pontes entre culturas, territórios e vivências que se encontram na batida comum da liberdade.
Bravat é daqueles artistas que não apenas tocam, mas acolhem. Cada apresentação é carregada de propósito, com entrega emocional e compromisso com a cena queer, tanto nos grandes palcos quanto ao lado de novos talentos em ascensão.
Nesta entrevista exclusiva ao Cultura Queer e a Rádio Power Strike, DJ Bravat fala sobre momentos marcantes da sua carreira internacional, os bastidores que ninguém vê, o impacto de representar a comunidade LGBTQIA+ no Brasil e no mundo, e a força que encontra na conexão com o público.
Sua carreira se estende por mais de uma década, com apresentações em mais de 70 lugares pelo mundo. Houve algum momento definidor em que você se deu conta de que havia conquistado seu espaço na cena internacional como DJ brasileiro?
Ter a oportunidade de me apresentar ao lado de artistas renomados e receber reconhecimento da crítica e do público me fez entender que realmente havia conquistado meu espaço na cena internacional.
Esse sentimento de pertencimento e aceitação, especialmente vindo de um público tão diversificado, foi um marco na minha trajetória. A partir deste momento (creio que por volta do ano de 2013), percebi que a música poderia ser um veículo poderoso para a união e a celebração da diversidade, e isso me motivou a continuar explorando e expandindo minha carreira.
Com uma lista tão extensa de países e clubes onde já tocou, devem existir histórias incríveis. Existe alguma experiência de bastidor inusitada ou um momento inesquecível de alguma apresentação internacional que tenha te marcado profundamente?
Não existe exatamente um momento inesquecível, até porque, em 18 anos de carreira, vivenciei diversos episódios com emoções diferentes. Todos foram importantes e relevantes para o meu crescimento como profissional.
Mas situações de bastidores, como por exemplo o pendrive não ser lido pelo CDJ, os dois CDJs travarem ao mesmo tempo (rs), ou o pino do fone se romper dentro do mixer e eu ser obrigado a mixar sem fone… todos esses momentos marcantes foram verdadeiras provas de fogo na minha carreira e me ajudaram a ser o profissional que sou hoje.
Seu som cativa públicos de culturas diferentes. Como você adapta seus sets e sua energia ao tocar em lugares tão diversos, e o que aprendeu sobre conectar pessoas através da música ao redor do mundo?
Adaptar meus sets e minha energia ao tocar em lugares com culturas diferentes é um desafio que encaro com muita dedicação. Cada local tem suas particularidades, e isso me inspira a ser flexível.
Costumo pesquisar sobre o público e suas preferências musicais antes de cada apresentação. Durante o set, busco criar uma conexão emocional com o público, utilizando elementos que sejam familiares para eles, ao mesmo tempo em que introduzo minhas próprias influências.
Dessa forma, aprendi que a música é uma linguagem universal. Independentemente das barreiras culturais, as emoções que ela evoca são semelhantes. A alegria, a dança e a celebração são sentimentos que todos compartilham.
Esse entendimento me motiva a criar sets que não apenas entretenham, mas que também unam as pessoas, gerando um espaço de inclusão e liberdade. Por fim, o que realmente importa é a conexão genuína que conseguimos estabelecer através da música, transformando cada evento em uma celebração única.
Estar na estrada global desde 2009 certamente trouxe desafios. Teve algum obstáculo significativo que você enfrentou por ser um artista brasileiro se apresentando no exterior, e como você o superou?
Ser um DJ brasileiro atuando no cenário global desde 2009 tem sido uma jornada incrível, mas não isenta de desafios. Um dos obstáculos significativos que enfrentei foi, sem dúvida, a questão da aceitação e do reconhecimento.
Em alguns lugares, a cultura local pode ser bastante diferente e, às vezes, até resistente. Uma situação que me marcou foi ao me apresentar em um festival em um país onde a música eletrônica ainda estava em ascensão e a cena LGBTQIA+ não era tão visível. Inicialmente, percebi que o público estava um pouco hesitante em se entregar.
Para superar isso, decidi integrar elementos da cultura brasileira, como ritmos e melodias que trouxessem um pouco da nossa identidade. Aprendi que, apesar das barreiras, a música tem o poder de unir pessoas. E essa resiliência é fundamental na carreira de qualquer artista que deseja deixar uma marca no mundo.
Representar a cena eletrônica brasileira mundo afora traz uma grande responsabilidade. Como você enxerga o impacto de levar consigo a bandeira LGBTQIA+ brasileira a palcos internacionais?
Representar a cena eletrônica brasileira no exterior, especialmente levando a bandeira LGBTQIA+ comigo, é, sem dúvida, uma grande responsabilidade e uma honra.
A música tem um poder transformador e, ao tocar em palcos internacionais, sinto que não estou apenas apresentando um set, mas também compartilhando uma parte da rica cultura e diversidade do Brasil.
Meu papel como DJ se estende além da música. É sobre construir pontes entre culturas, inspirar outras pessoas e promover a aceitação.
A responsabilidade que carrego é motivadora e me impulsiona a continuar trabalhando para que a cena eletrônica brasileira e a comunidade LGBTQIA+ sejam cada vez mais representadas e celebradas em todo o mundo.
Você construiu uma reputação sólida na cena global. Houve algum momento em que um artista que você admira reconheceu seu trabalho? Como foi receber esse tipo de reconhecimento vindo de alguém especial para você?
Não foi exatamente de um artista, mas sim um reconhecimento vindo de um produtor de festas mundialmente reconhecido. Foi emocionante para mim e me fez sentir que todo o esforço e dedicação que coloquei no meu trabalho estavam valendo a pena.
A validação de alguém que tem tanta influência na indústria realmente acendeu uma nova chama de motivação dentro de mim. Receber aquele reconhecimento foi como ganhar um selo de aprovação, não apenas pelo meu talento, mas também pela minha visão artística.
A sensação de ver meu trabalho sendo apreciado por alguém que admiro tanto foi indescritível e reforçou minha crença de que estou no caminho certo.
Após tocar em tantos lugares, há algum destino ou público que te surpreendeu pela conexão intensa que tiveram com o seu som? O que tornou essa experiência tão diferente das demais?
Uma das experiências mais memoráveis que tive foi tocando na festa Backdoor, em Amsterdam. Desde a primeira vez que pisei naquela cabine, há seis anos, até hoje, senti uma conexão intensa com o público que realmente me surpreendeu.
O público da Backdoor é conhecido por ser muito aberto e acolhedor, e isso se reflete na forma como eles se entregam à música.
Vivenciando culturas de festa ao redor do mundo, qual foi a maior inspiração que você trouxe de volta para o Brasil em termos de música ou performance?
Ao longo da minha carreira, tive a oportunidade de vivenciar uma variedade incrível de culturas de festa ao redor do mundo. Uma das maiores inspirações que trouxe de volta para o Brasil foi a ideia de criar experiências e novas sonoridades para o público brasileiro.
Mesmo com a agenda internacional, você mantém laços com a cena local. Como foi ver a evolução da cena eletrônica LGBTQIA+ no Brasil desde que você começou até hoje, e de que forma você procura contribuir para esse crescimento?
É incrível ver a evolução da cena eletrônica LGBTQIA+ no Brasil ao longo dos anos. Quando comecei, a cena era muito mais restrita, e havia menos visibilidade para artistas e eventos voltados para a comunidade.
Nos últimos anos, no entanto, houve um aumento significativo. A presença de DJs e produtores LGBTQIA+ se tornou mais proeminente, e isso ajuda a inspirar novas gerações de artistas.
Para contribuir com esse crescimento, busco sempre apoiar, dando espaço para novos talentos e colaborando com artistas emergentes. A cena eletrônica LGBTQIA+ no Brasil evoluiu de forma significativa e continua a se transformar.
É um privilégio fazer parte desse movimento e contribuir com a cena desde sempre.
Com tantos anos de estrada, cada apresentação sua carrega muita experiência. O que o DJ Bravat de hoje diria ao DJ Bravat de 2009, quando você estava começando e talvez tocando para públicos bem menores?
Se eu pudesse ter uma conversa com o DJ Bravat de 2009, diria que a jornada é uma parte essencial do processo. A primeira coisa que eu ressaltaria é a importância de acreditar em si mesmo e na sua música.
Também falaria sobre ser autêntico e fiel ao seu estilo. Às vezes, a pressão para se encaixar em tendências pode ser forte, mas é fundamental manter a identidade musical.
Além disso, destacaria a importância do networking e das conexões, bem como a necessidade de estar sempre aprendendo. A tecnologia e as tendências musicais estão em constante evolução, então é essencial se manter atualizado e aberto a novas influências.
Por fim, eu diria para aproveitar cada momento. Olhar para trás com gratidão e orgulho é essencial, pois cada experiência contribui para o DJ Bravat que sou hoje.
Por fim, considerando seus fãs brasileiros do Cultura Queer e sua audiência global da Rádio Power Strike, que mensagem de celebração e união você gostaria de compartilhar com essa comunidade LGBTQIA+ que acompanha sua música?
Independentemente de onde você esteja no mundo, você é parte de algo maior. A união que encontramos na música é um lembrete de que não estamos sozinhos.
Juntos, criamos um ambiente onde a aceitação e o amor prevalecem, onde cada um pode se sentir livre para ser autêntico. Vamos continuar dançando, amando e apoiando uns aos outros, porque é na união que encontramos a verdadeira força.
Estou eternamente grato por cada um de vocês que me acompanha nessa jornada. Vamos continuar avançando juntos, dançando ao ritmo do amor e da aceitação, e fazendo da nossa cena um lugar cada vez mais vibrante e acolhedor.
DJ Bravat construiu mais do que uma carreira internacional. Ele ergueu uma trajetória marcada pela autenticidade, pela coragem de se manter fiel à própria identidade sonora e pelo compromisso de representar, com orgulho, a diversidade da cena eletrônica LGBTQIA+ brasileira.
Sua presença nas pistas é também presença política, emocional e artística. Cada set, cada apresentação e cada gesto de bastidor carregam a missão de unir pessoas em torno da liberdade, do afeto e da música que conecta sem fronteiras.
Bravat é exemplo de consistência e renovação. Um artista que transforma experiências pessoais em potência coletiva, e que segue inspirando, acolhendo e abrindo caminho para uma nova geração de talentos queer na música eletrônica global.
Instagram: @bravatdj
YouTube: DJ Rodolfo Bravat
SoundCloud: BRAVAT