DJ Dri Toscano: 15 anos de som, resistência e conexão com a cena LGBTQIA+

DJ Dri Toscano 15 anos de som, resistência e conexão com a cena LGBTQIA+

Com uma carreira que atravessa mais de 15 anos de transformação, Dri Toscano não apenas acompanhou a evolução da cena eletrônica LGBTQIA+. Ela fez parte ativa dessa história. Carioca, enérgica e intuitiva, Dri construiu sua identidade artística nas pistas mais diversas do Brasil e do mundo, desde clubes alternativos até festivais de grande porte, sempre com um olhar sensível e uma escuta precisa sobre quem está dançando ali.

Sua versatilidade não nasceu do acaso, mas da experiência. Da primeira festa tocando para um público misto de globais até sua residência em casas icônicas como o 00 e a The Week, Dri aprendeu a se comunicar com públicos plurais. Ela transformou essa escuta em assinatura. Sua leitura de pista vai além da técnica: ela toca com o coração, e isso se traduz em sets marcados por vocais potentes, memórias afetivas e uma conexão real com quem está na pista.

Mulher em um meio predominantemente masculino, artista LGBTQIA+ em um mercado ainda desigual, Dri abriu caminhos com talento, firmeza e afeto. Seu som é político, porque acolhe. É estético, porque emociona. É vivo, porque pulsa experiência.

Nesta entrevista exclusiva ao Cultura Queer e a Rádio Power Strike, Dri Toscano fala sobre suas influências, bastidores da cena, o desafio de manter sua identidade artística em meio às mudanças do mercado e o legado que deseja deixar para as próximas gerações de DJs queer.

Entrevista exclusiva com DJ Dri Toscano

 O som de Dri Toscano: emoção, energia e conexão com a pista

Você tem mais de 15 anos de carreira e é reconhecida por se adaptar com maestria a qualquer pista, sempre interagindo de forma marcante com o público. Como você desenvolveu essa versatilidade e qual foi o momento mais desafiador em que precisou “ler” a pista para conquistar um público diverso?

Bom, eu já comecei sendo “desafiada”, porque a primeira festa que toquei era para um público misto, em uma boate hétero lotada de globais! Ou seja, cada um gostava de uma coisa, e a proposta era tocar clássicos de várias décadas no estilo tribal house.

Depois fui tocar na Noite Preta (show da Preta Gil que rolava toda quinta na antiga The Week Rio), e me tornei residente. Novamente, o público era uma mistura de artistas, héteros e gays, sendo a maioria da cena pop.

Também fui residente do antigo 00, uma boate tradicional da Gávea por muitos anos, até o seu fechamento, tocando na festa Duo, a mais “hypada” dos domingos no RJ. Mais uma vez, um público completamente heterogêneo.

Todas essas experiências foram essenciais para me construir como DJ e fizeram com que minha leitura de pista se tornasse tão eficaz.

Sua trajetória inclui apresentações em diversos países, de Portugal e Espanha aos Estados Unidos e Colômbia. O que essas experiências internacionais lhe ensinaram sobre as diferentes culturas de pista, e de que forma a carioca Dri incorpora elementos brasileiros em seus sets para conectar públicos tão distintos?

Antes de viajar para qualquer país, é importante saber o que se ouve por lá. Quais são os hits mais tocados e se há alguma música nacional que seja uma febre. Caso tenha, procuro sempre fazer algo com ela.

Também presto atenção na média de idade do público daquela festa específica. Nunca programo um set. Ele vai variar de acordo com a resposta da pista.

Os DJs cariocas, no geral, têm um som mais alegre, mais pra cima. Então essa energia acaba transbordando naturalmente.

Você já tocou em grandes eventos da música eletrônica, como o Hell & Heaven, o Rio Music Conference e o Chemical Music Festival. Como é levar o som da cena LGBTQIA+ brasileira para palcos tão importantes e heterogêneos? Há alguma apresentação memorável nesses festivais que tenha transformado sua perspectiva como artista?

Sim! Tive duas apresentações que me marcaram muito.

No Chemical Music Festival, em 2012, toquei na tenda de house, que ficava ao lado da principal, onde rolava psy-trance. Peguei a pista vazia, porque um dos headliners da noite estava na principal. Na minha terceira música, eu já não via mais o fim da pista. Estava lotado, com uma energia incrível, e o público hétero curtindo tribal (adaptado, rs) e interagindo comigo o tempo todo.

Também fiz o warm-up para o Bob Sinclar no Rio Music Conference, e foi uma experiência única.

Além de DJ, você também atua como empreendedora por meio do projeto Smart DJs. Poderia nos contar sobre essa iniciativa e como ela contribui para a profissionalização e inclusão de novos talentos na música eletrônica?

Por enquanto, esse projeto está só começando.

A ideia é alugar equipamentos de DJs que têm aparelhos parados em casa e acabam não usando, já que temos muitos eventos corporativos que precisam, e às vezes os nossos equipamentos não dão conta. É tipo um “Airbnb” de equipamentos, rs. Não são nossos, mas todo mundo sai ganhando.

Também estamos começando a organizar logística para DJs que não têm agência, já que meu sócio tem uma agência de viagens e trabalha com turismo há bastante tempo.

Sendo uma mulher DJ em um circuito muitas vezes dominado por homens, especialmente nas festas LGBTQIA+, que barreiras você enfrentou no início da carreira? E de que maneira superar esses desafios moldou sua identidade artística?

Hoje em dia, as mulheres são tratadas de igual para igual na cena brasileira. Em alguns países, ainda existe uma preferência por homens, até pelas temáticas das festas.

No começo, enfrentei bastante preconceito, mas sou uma pessoa tão simpática e desligada que nem me abalava com certas situações. Também ajudou o fato de eu ser “sarada”, meio “bofinho”, vestida como as gays padrão. Acho que isso criava uma conexão. Kkkkk!

A comunidade LGBTQIA+ adotou seu som ao longo dos anos, e você se tornou parte de muitas celebrações importantes desse público. Como você enxerga o papel do DJ em criar espaços de acolhimento e euforia para a comunidade queer? Pode compartilhar alguma experiência marcante?

Eu sempre me conecto muito com o público. Desde que comecei a tocar, sinto essa necessidade de tocar as pessoas, de trazer memórias afetivas, de cantar junto. Volto pra casa com a energia renovada.

Não tenho um dia específico, mas fico feliz demais lendo os feedbacks ao longo da semana. Pessoas que dizem que não estavam bem e que eu mudei a energia delas através da música.

Isso é o que me motiva a continuar dando o meu melhor sempre.

Seu estilo musical transita entre o house e o tribal, com remixes cheios de energia. Quais artistas ou experiências influenciaram sua construção sonora e como você busca inovar em cada set?

 DJ Dri Toscano e a força feminina na cena eletrônica LGBTQIA+

A gente nunca para de aprender. Acho que esse é o segredo para se manter atualizada. Estar aberta a novos estilos, experimentar outras bases e elementos.

Tanto DJs clássicos quanto novos me influenciam. Nem conseguiria citar nomes, porque são estilos muito diferentes. Um DJ de house, na minha visão, precisa entender um pouco de tudo. Isso ajuda a construir sua própria personalidade musical.

Amo quando toco em um lugar e alguém diz: “Não precisei nem olhar pro palco pra saber que era você que estava tocando.”

Com uma longa história na cena eletrônica, você testemunhou transformações culturais importantes. Como sua arte dialoga com essas mudanças, especialmente no contexto LGBTQIA+, e qual legado você gostaria de deixar?

Sim, eu acompanhei mudanças gigantescas no som e no público. Acho que já vivi pelo menos três gerações diferentes, rs. “Sapa rodada”!

Sempre tem o lado bom e o ruim de cada fase, mas acredito que os grandes clubes e DJs também devem ajudar a direcionar isso.

O tribal quase desapareceu no Brasil com a ascensão das festas pop. Antigamente, a cena tribal tocava só remixes de artistas da própria comunidade LGBTQIA+, como Maya, Deborah Cox, Deborah Cooper, Georgie Porgie. Mas tivemos que incorporar o pop para continuar existindo.

Após a pandemia, veio outra grande mudança. Muitos DJs principais não estavam tocando, e os DJs de after entraram com tudo.

As novinhas se acostumaram com um som mais pesado, e isso criou uma tendência. Mas também trouxe problemas. Cultura do VIP, uso excessivo de drogas e giro de bar baixo, que muitas vezes não cobre nem os custos da festa.

A presença digital tornou-se essencial para os DJs atuais. Como essa conexão virtual influenciou sua carreira e o que aprendeu sobre se reinventar, especialmente na pandemia?

Isso pra mim é o mais difícil, rs. Ensino meus alunos a fazerem, mas confesso que não tenho muita paciência.

Porém, hoje em dia, isso é quase mais importante do que o próprio talento. Faz sentido. O valor do cachê está atrelado ao público que você leva para o evento.

Durante a pandemia, fiz duas lives, mas com os novos projetos acabei descuidando um pouco da minha imagem como DJ.

Muita gente conhece a DJ Dri Toscano nos palcos, mas há algo sobre sua jornada pessoal ou artística que ainda não foi explorado em entrevistas?

Muita gente está me conhecendo agora pelo episódio do “PodPop” que gravei em São Paulo. Falei bastante sobre minha vida pessoal e trajetória por lá.

Mas é muita história pra contar, kkkkk.

Você construiu uma carreira que mistura técnica, sensibilidade e paixão pela pista. Como acredita que sua música pode inspirar tanto os fãs brasileiros do Cultura Queer quanto os ouvintes internacionais da Rádio Power Strike?

Meus sets criam memórias afetivas. Meus fãs me param e contam histórias que eu nem lembro, mas que ficaram marcadas pra eles. Isso é gratificante demais.

Hoje, com os meus alunos, quero deixar um legado. Quero que eles circulem pelo mundo, toquem nas grandes festas e digam: “Foi a Dri que me ensinou tudo.”

Espero que os ouvintes da rádio sintam essa conexão também, por meio de vocais clássicos e atuais que marcaram momentos especiais.

 15 anos de carreira, memória afetiva e legado na música

A pista é o palco, mas o legado de Dri Toscano vai muito além das cabines.

Ao longo de mais de uma década, Dri construiu uma carreira que une técnica, emoção e compromisso com quem dança. Cada set é um reencontro com o passado, uma celebração do presente e uma promessa de futuro mais livre, inclusivo e cheio de som.

Sua música não é só entretenimento. É resistência. É afeto. É identidade. E é justamente por isso que ela segue conquistando pistas, corações e novos talentos que a reconhecem como inspiração e referência.

Dri Toscano não se limita ao papel de DJ. Ela é mentora, empreendedora, multiplicadora de memórias e movimentos. E se depender dela, a próxima geração vai continuar tocando com alma e fazendo história com orgulho.

Siga DJ Dri Toscano nas redes sociais:

Instagram: @dritoscano
YouTube: DJ Dri Toscano
DJ Sessions: SoundCloud – DJ Sets & Live Sessions

5 Comments

(Hide Comments)
  • Giba Santa Rosa

    abril 23, 2025 / at 11:06 pmResponder

    As noites na Boate 00 aos domingos eram pra fechar o meu final de semana com chave de ouro! Os sets de Dri Toscano sempre foram garantia de muita dança/diversão!

  • Viviane

    abril 23, 2025 / at 11:15 pmResponder

    É uma carreira linda e tive o privilégio de acompanhar desde que tudo começou! Parabéns pela sua jornada. Você é uma DJ fora da curva e um ser humano incrível! Muito sucesso Dri Toscano 🔥😘

    • Felipe

      abril 24, 2025 / at 5:36 amResponder

      Acompanho o trabalho da Dri há muito tempo — desde a época em que era residente na boate 00, passando por diversas festas no Rio e até fora do país. Ela é, sem dúvida, uma DJ que entende seu público, sabe ser autêntica e sempre entrega sets únicos e envolventes

  • Felipe Chermont

    abril 23, 2025 / at 11:36 pmResponder

    Sem dúvida uma Dj incrível e talentosa… Um ícone da cena eletrônica brasileira.

  • Adriana Camargo

    abril 24, 2025 / at 6:16 amResponder

    Dri é um ser humano maravilhoso e uma DJ sensacional, referência e fora da curva. Além de muito divertida. A melhor! Amo!

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