Caçada LGBTQIA+ de Putin transforma festas e clubes em alvos do governo

Caçada LGBTQIA+ de Putin transforma festas e clubes em alvos do governo

A Rússia de Vladimir Putin entrou, sem disfarces, numa guerra declarada contra a comunidade LGBTQIA+. Desde novembro de 2023, quando a Suprema Corte russa classificou o “movimento internacional LGBTQIA+” como uma organização extremista, a repressão virou política oficial de Estado. Não se trata mais de discursos velados, mas de ações sistemáticas, violentas e institucionalizadas que miram não só ativistas, mas qualquer cidadão LGBTQIA+.

A morte de Andrei Kotov: um símbolo da brutalidade

Em dezembro, a polícia invadiu o apartamento de Andrei Kotov, empresário que administrava uma agência de viagens voltada para homens. Ele foi amarrado, espancado e coagido a assinar uma confissão falsa. Acusado de promover o turismo gay, Kotov acabou preso — e semanas depois, foi encontrado morto na cela. A versão oficial fala em suicídio com uma lâmina. Mas sua advogada, Leysan Mannapova, afirmou que exames não apontavam qualquer tendência suicida. Sua mãe, devastada, denunciou o absurdo: “Não estava nada claro como organizar viagens para homens poderia ser considerado extremista.”

A acusação absurda de “crime contra a ordem constitucional” evidencia a manipulação jurídica para justificar a repressão. Kotov também foi acusado de possuir imagens de abuso sexual infantil — uma narrativa comum nesses casos, usada para criminalizar e silenciar.

A escalada da perseguição após 2023

A repressão ganhou força após a decisão judicial de novembro de 2023. Ao equiparar o movimento LGBTQIA+ a grupos terroristas como al-Qaeda e Estado Islâmico, o Estado russo legalizou sua própria violência. Em 2024, pelo menos 12 investigações foram abertas por “extremismo LGBTQIA+”, segundo o grupo OVD-Info.

Denis Olyenik, diretor da ONG Coming Out, explicou que a perseguição deixou de mirar apenas ativistas. Agora, qualquer pessoa LGBTQIA+ pode ser um alvo — basta frequentar uma festa ou boate.

Casas noturnas, festas e até fantasias viram ameaça ao regime

Sergei Artyomov, produtor de TV, estava numa boate em Moscou quando policiais invadiram o local, bloquearam as saídas e revistaram todos. “Eles chamam você de inimigo do povo, e é isso.” Ele deixou a Rússia pouco antes do Natal, buscando asilo na Espanha.

Em Yakutia, região isolada da Sibéria, o canal Pryany Yakutsk, popular no Telegram, denunciou festas com “artistas travestis tailandeses”. As imagens viralizaram e serviram de base para multas a clubes — como no caso de um que foi penalizado em 250 mil rublos (cerca de R$ 17.700) por “promover relações sexuais não-tradicionais”.

A máquina de ódio do Kremlin

A campanha estatal tem três frentes principais: forças policiais, grupos justiceiros e a mídia governamental. A “Comunidade Russa”, que se define como um coletivo de “justiceiros sociais”, publica imagens de invasões policiais em boates e promove delações. A mídia estatal bombardeia a população com propaganda sobre as virtudes das famílias heterossexuais e da “pureza moral”.

No início de 2025, Putin determinou que o governo criasse uma estratégia nacional para incentivar “famílias numerosas”. Ao mesmo tempo, as ações contra a comunidade LGBTQIA+ se intensificaram — com prisões, perseguições judiciais e campanhas de difamação.

O apoio popular à repressão

Segundo o instituto independente Levada, entre 2013 e 2025 o apoio da população russa à equiparação de direitos caiu de 47% para 38%. A propaganda funciona. Jovens ainda demonstram maior aceitação, mas estão cercados por um ambiente de ódio, medo e censura.

Comunidade trans também na mira

Em 2023, o governo russo aprovou uma lei que proíbe acesso a cuidados de saúde para pessoas trans e impede a mudança de gênero em documentos oficiais. O impacto foi devastador. Muitos buscaram refúgio fora do país — mas nem todos conseguem ou querem partir.

Tahir, um homem gay de 25 anos, deixou claro que não pretende fugir: “Sei que as coisas vão piorar, mas não quero partir. Este país é meu tanto quanto de todos os outros russos.”

O que está em jogo?

A repressão na Rússia não é só um ataque aos direitos LGBTQIA+. É um projeto autoritário, que usa o ódio como instrumento de controle social. A comunidade LGBTQIA+ se tornou o bode expiatório perfeito para alimentar a máquina de propaganda e consolidar o regime de Putin. O silêncio diante dessa realidade é cúmplice. Cada festa invadida, cada vida destruída, cada corpo silenciado carrega o peso de um Estado que escolheu perseguir, ao invés de proteger.

O mundo precisa olhar para a Rússia — não com surpresa, mas com indignação e ação. Porque o que está acontecendo lá é mais do que uma repressão: é um massacre silencioso.

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